Um Campo magnético é uma região do espaço onde se manifesta o magnetismo, através das chamadas acções magnéticas. Estas acções verificam-se à distância e apenas algumas substâncias são influenciadas pelo campo magnético.

terça-feira, dezembro 27

As palavras são coisas


Falamos das coisas e elas acontecem

por isso ciciamos o que nos pede o corpo

não são as coisas só aquilo que dizemos

nossas pobres palavras não as dizem inteiras?

As palavras são coisas, extremas, luminosas,

quando tu dizes porta, há uma porta que se abre

quando tu dizes sexo, há um amor que se cumpre

não sabemos sequer o poder das palavras

nem o poder das coisas nem o poder dos rostos.

As coisas são palavras feridas pela morte

são agulhas finíssimas que trespassam a noite

os teus lábios dizem coisas os teus lábios cintilam

por eles fala o mundo, por eles se faz o oiro

pois o mundo acontece sempre que o pronuncias.



de Bernardo Pinto de Almeida


sábado, novembro 26


É hoje WhoMadeWho e ....






... é hoje! (Jamie Lidell)

sábado, novembro 19

A escrita é a minha primeira morada de silêncio
a segunda irrompe do corpo movendo-se por trás
das palavras
extensas praias vazias onde o mar nunca chegou
deserto onde os dedos murmuram o último crime
escrever-te continuamente... areia e mais areia
construindo no sangue altíssimas paredes de nada

esta paixão pelos objectos que guardaste
esta pele-memória exalando não sei que desastre
a língua de limos

espalhávamos sementes de cicuta pelo nevoeiro
dos sonhos
as manhãs chegavam como um gemido estelar
e eu perseguia teu rasto de esperma à beira-mar

outros corpos de salsugem atravessam o silêncio
desta morada erguida na precária saliva do
crepúsculo



Al Berto, O Medo, Lisboa, Assírio & Alvim, 1997

quarta-feira, novembro 16

romantic rights


Your romantic rights are all that you got,
Push'em down son it's more than just lip,
C'mon girl I know you know what you want,
C'mon c'mon now and give'em all shhhh

You're beating walls now you just won't quit,
You play with shapes but they just won't fit,
I know you love me you don't know what you like,
You're watching TV I stay up all night.

I don't need you, I want you

South Carolina kid is heating things up,
His wounds are bleeding and we're filling the cup,
This game will save us if we don't die young,
C'mon c'mon yeah, have some fun.

Come here baby I love your company,
We could do it and start a family,
She was living alone, unhappily
We could do it, it's right romantically.

I don't need you, I want you



death from above 1979

sábado, novembro 5

Peach, Plum, Pear

We speak in the store
I'm a sensitive bore
And you're markedly more
And i'm oozing suprise

But it's late in the day
And you're well on your way
What was golden went gray
And i'm suddenly shy

And the gathering floozies
Afford to be choosy
And all sneezing darkly
In the dimming divide

And i have read the right books
To interpret your looks
You were knocking me down
With the palm of your eye

Go; na na na na na na na na na na
Na na na na na na na na na na
Na na na na na na na na

This was unlike the story
It was written to be
I was riding its back
When it used to ride me

And we were galloping manic
To the mouth of the source
We were swallowing panic
In the face of its force

And i was blue
I am blue
And unwell
Made me bolt like a horse
[made me bold like a whore]

And; na na na na na na na na na na
Na na na na na na na na na na
Na na na na na na na na

Now it's done
Watch it go
And you've changed so

Water run from the snow

Am i so dear?
Do i run rare?
And you've changed
So

Peach, plum, pear
Peach, plum


Joanna Newsom


Há sempre uma música certa para uma altura certa....


quinta-feira, novembro 3




É hoje.
Final Fantasy.

quarta-feira, novembro 2


Woman :
Charlie... I've, uh... I've been with another man.
Aren't you gonna say anything ? You're just gonna sit there ?
Oh Charlie, I didn't know when you were coming back or if you ever would.
I tell you, the men around here don't respect anything ; if I told you all the guys that called me up...
And then Cliff... He didn't make a pass at me. I mean he didn't even... do it at all, Charlie.
I knew what he wanted, but... he never did anything about it.
And then it just seemed like the two of us just had to.

Charlie : I don't think I'm up for any more of this.
Why don't you go to bed ? I'll work this all out.

Woman : What are you gonna do ?

Charlie : I'm just gonna sit here.


domingo, outubro 23

Casa

Tentei fugir da mancha mais escura
que existe no teu corpo, e desisti.
Era pior que a morte o que antevi:
era a dor de ficar sem sepultura.

Bebi entre os teus flancos a loucura
de não poder viver longe de ti:
és a sombra da casa onde nasci,
és a noite que à noite me procura.

Só por dentro de ti há corredores
e em quartos interiores o cheiro a fruta
que veste de frescura a escuridão. . .

Só por dentro de ti rebentam flores.
Só por dentro de ti a noite escuta
o que sem voz me sai do coração.

David Mourão Ferreira

domingo, outubro 16

Na próxima quinta-feira, dia 20, os Animal Collective vão tocar num cacilheiro em pleno Rio Tejo. Não podia ser melhor, o novo album trás a confirmação de uma das bandas mais marcantes e que mais vão marcar este decada.

Fica aqui um pouco do mágico Banshee Beat, oiçam o quanto antes.


Banshee Beat

There ll be time to get by to get dry after the swimming pool
therell be time to just cry i wonder why it didnt work out
therell be time to fish fry for letters by yours truly
Yours truly

Someone in my dictionary?s up to no good i never find the very special words i should
so i have another party with a water glass and i sit on all your actions its a birthing game
and ill bet he needs a shower cause hes just like me and the soldiers in the painting know your secret face
well your parrot told me just how i can make you smile gonna let you do your thinking if you need awhile
but what i gave you made him get mad a little bit funny how a thing like that
could travel from one mouth in through another and the next thing you know you gotta hear it from your brother and
the words they sting like a stump of old wasps remember when i said go throw the rock in there
and we ran through the woods to our good house you forgot about the things that he could say like
i dont think that i like you anymore well i found new feelings at the feeling store
and i cant find you at our kissing place and im scared of those new pair of eyes you have
so i duck out and go down to find the swimming pool
hop a fence leave the street and wet my feet ill find a swimming pool
caused when im snuffed out i doubt ill find a swimming pool
hop a fence?..

but i dont wish that i was dead a very old friend of mine once said
that either way you look at it you have your fits i have my fits but feeling is good
confusions not a kiddney stone in my brain but if were miscommunicating do we feel the same
then either way you look at it you have your fits i have my fits but feeling is good.

You gotta give a little you gotta get a little bit


by Animal Collective

sábado, setembro 10

TENHO DÓ DAS ESTRELAS


Tenho dó das estrelas
Luzindo há tanto tempo,
Há tanto tempo?
Tenho dó delas.

Não haverá um cansaço
Das coisas,
De todas as coisas
Como das pernas ou de um braço?

Um cansaço de existir,
De ser,
Só de ser,
O ser triste brilhar ou sorrir?

Não haverá, enfim,
Para as coisas que são,
Não morte, mas sim
Uma outra espécie de fim,
Ou uma grande razão ?
Qualquer coisa assim
Como um perdão?



Fernando Pessoa
in Andrade, Eugénio de, "Antologia Pessoal
da Poesia Portuguesa", Porto,
Campo das Letras, 1999, p. 341.

quinta-feira, setembro 8

A poesia como o amor faz-se na cama
Os seus lençóis desfeitos são a aurora das coisas
A poesia faz-se nas matas

Tem todo o espaço de que precisa
Não este mas o outro condicionado por

O olho do milhafre
O orvalho sobre a cavalinha
A lembrança duma garrafa de Traminer embaciada em bandeja de prata
Uma alta vara de turmalina sobre o mar
E a estrada da aventura mental
Que sobe a prumo
Pára e fica logo coberta de mato

Isto não se apregoa aos quatro ventos
Não é conveniente deixar a porta aberta
Ou chamar testemunhas

Os cardumes de peixes os bandos de melharucos
Os carris à entrada duma grande estação
As luzes das duas margens
Os sulcos do pão
A espuma da ribeira
Os dias do calendário
O hipericão

Acto de amor e acto de poesia
São incompatíveis
Com a leitura do jornal em voz alta

O sentido do raio de sol
O clarão azul que liga as machadadas do lenhador
O fio do papagaio de papel em forma de coração ou de laço
O batimento ritmado da cauda dos castores
A diligência do relâmpago
O arremesso dos confettis do alto de velhas escadas
A avalanche

A câmara dos sortilégios
Não cavalheiros não é a oitava Câmara
Nem os vapores da camarata ao domingo à noite

Os passos de dança transparentes por cima dos mares
A demarcação na parede dum corpo de mulher ao lançar de punhais
As claras volutas do fumo
Os anéis do teu cabelo
A curva da esponja das Filipinas
Os nós da serpente vermelha
A entrada da hera nas ruínas
Tem todo o tempo à sua frente
O abraço poético como o abraço carnal
Enquanto dura
Impede toda a fugida sobre a miséria do mundo


André Breton 1948

domingo, julho 24

Projecto de Sucessão


Continuar aos saltos até ultrapassar a Lua
continuar deitado até se destruir a cama
permanecer de pé até a polícia vir
permanecer sentado até que o pai morra

Arrancar os cabelos e não morrer numa rua solitária
amar continuamente a posição vertical
e continuamente fazer ângulos rectos

Gritar da janela até que a vizinha ponha as mamas de fora
pôr-se nu em casa até a escultora dar o sexo
fazer gestos no café até espantar a clientela
pregar sustos nas esquinas até que uma velhinha caia
contar histórias obscenas uma noite em família
narrar um crime perfeito a um adolescente loiro
beber um copo de leite e misturar-lhe nitro-glicerina
deixar fumar um cigarro só até meio
Abrirem-se covas e esquecerem-se os dias
beber-se por um copo de oiro e sonharem-se Índias.



António Maria Lisboa
Assírio & Alvim
1995

sábado, julho 16

Um dia quando a ternura for a única regra da manhã

um dia, quando a ternura for a única regra da manhã,
acordarei entre os teus braços. a tua pele será talvez demasiado bela.
e a luz compreenderá a impossível compreensão do amor.
um dia, quando a chuva secar na memória, quando o inverno for
tão distante, quando o frio responder devagar com a voz arrastada
de um velho, estarei contigo e cantarão pássaros no parapeito da
nossa janela. sim, cantarão pássaros, haverá flores, mas nada disso
será culpa minha, porque eu acordarei nos teus braços e não direi
nem uma palavra, nem o príncipio de uma palavra, para não estragar
a perfeição da felicidade.

José Luís Peixoto

terça-feira, junho 21

Os Album da minha semana foram muito calmos e contemplativos, nada de grande sobressaltos, não é altura para isso...

1. Elliott Smith - Figure 8 (2000)
2. Devendra Banhart - Rejoicing in the Hands (2004)
3. Radiohead - Kid A

As músicas ouvidas em replay:

1. Elliott Smith - Everything Reminds Me of Her
2. Bonnie "Prince" Billy and Matt Sweeney - Blood Embrace
3. M.I.A. - Pull Up The People

quarta-feira, junho 15

VEGETAL E SÓ

É outono, desprende-te de mim.

Solta-me os cabelos, potros indomáveis
Sem nenhuma melancolia,
Sem encontros marcados,
Sem cartas a responder.

Deixa-me o braço direito
O mais ardente dos meus braços,
O mais azul
O mais feito para voar.

Devolve-me o rosto de um verão
Sem a febre de tantos lábios,
Sem nenhum rumor de lágrimas
Nas pálperas acessas.

Deixa-me só, vegetal e só,
Correndo como rio de folhas
Para a noite onde a mais bela aventura
Se escreve exactamente sem nenhuma letra.


in «As palavras Interditas» (1951)
de Eugénio de Andrade

segunda-feira, junho 13

ADEUS

Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mãos à força de as apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras das esquinas
em esperas inúteis.

Meto as mãos nas algibeiras e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro;
era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.
Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes
E eu acreditava.
Acreditava.
porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.

Mas isso era no tempo dos segredos,
era no tempo em que o teu corpo era um aquário,
era no tempo em que os meus olhos
eram realmente peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco, mas é verdade,
uns olhos como todos os outros.

Já gastámos as palavras.
Quando agora digo: meu amor
já se não passa absolutamente nada.
E no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.

Não temos já nada para dar.
Dentro de ti
não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão gastas.

Adeus.


Eugénio de Andrade
in «Os Amantes sem Dinheiro» (1950)
AS PALAVRAS INTERDITAS

Os navios existem e existe o teu rosto
encostado ao rosto dos navios.
Sem nenhum destino flutuam nas cidades,
partem no vento, regressam nos rios.

Na areia branca, onde o tempo começa,
uma criança passa de costas para o mar.
Anoitece. Não há dúvida, anoitece.
É preciso partir, é preciso ficar.

Os hospitais cobrem-se de cinza.
Ondas de sombra quebram nas esquinas.
Amo-te... E entram pela janela
as primeiras luzes das colinas.

As palavras que te envio são interditas
até, meu amor, pelo halo das searas;
se alguma regressasse, nem já reconhecia
o teu nome nas minhas curvas claras.

Dói-me esta água, este ar que se respira,
dói-me esta solidão de pedra escura,
e estas mãos noturnas onde aperto
os meus dias quebrados na cintura.

E a noite cresce apaixonadamente.
Nas suas margens nuas, desoladas,
cada homem tem apenas para dar
um horizonte de cidades bombardeadas.


in «As palavras Interditas» (1951)
de Eugénio de Andrade

Os albums que mais tocaram esta semana:

  1. Smog - A River Ain't Too Much to Love (2005)
  2. The Decemberists - Picaresque (2005)
  3. Death From Above 1979 - You're A Woman, I'm A Machine (2004)

As músicas da semana:
  1. Smog - Let Me See The Colts, de "A River Ain't Too Much to Love"
  2. Death From Above 1979 - Romantic Rights, de "You're A Woman, I'm A Machine"
  3. Smog - The Well, de "A River Ain't Too Much to Love"

até

domingo, junho 5

Abandono-me ao ver-te de tal forma como eu sou que desejo que tudo continuasse assim, sem respirar, sem pestanejar, sem saber sequer para que lado me virar, assim indeciso, cheio de dúvidas e desatenções no caminho que intento seguir, riscando elipses pelo percurso e geometrizando a tua face sobrepondo-te os papéis e vendo-te cúbica, assim te toco as arestas e aconchego-te os vértices sem pensar sequer, sem respirar porque é uma perda de tempo desviar-me de ti, porque é mesmo um exercício de concentração no qual me perco tantas vezes que já lhes perdi a conta, assim sem nada pensar, sem nada respirar tento pronunciar cada frase mental de uma só vez, em exercícios de arrastamento que focam o movimento enérgico das palavras, apenas te inspirar naturalmente como se não te visse nem fosses tu o que vejo, dispo-te mais vezes ainda sem contar nem expirar para te manter aqui dentro de onde não possas sair, para que não valha a pena lutares porque não te vou largar, nem vou deixar que me espalhes nas memórias perdidas que cultivas em espirais tangentes ao círculo que vou desenrolando ao mesmo tempo que marco caminho, porque em ti me abandono enquanto imagens sincopadas me colorem o preto e branco reais, e são rápidos os segredos que me acompanham o pensamento, porque ao ver-te de tal forma como eu sou não me vejo eu mas como és assim, um rasgo rápido.


Texto de Patrícia Espinha

sexta-feira, junho 3

ROSTO


Rosto nu na luz directa.

Rosto suspenso, despido e permeável,
Osmose lenta.
Boca entreaberta como se bebesse,
Cabeça atenta.

Rosto desfeito,
Rosto sem recusa onde nada se defende,
Rosto que se dá na angústia do pedido,
Rosto que as vozes atravessam.

Rosto derivando lentamente,
Pressentimento que os laranjais segredam,
Rosto abandonado e transparente
Que as negras noites de amor em si recebem.

Longos raios de frio correm sobre o mar
Em silêncio ergueram-se as paisagens
E eu toco a solidão como uma pedra.

Rosto perdido
Que amargos ventos de secura em si sepultam
E que as ondas do mar puríssimas lamentam.


Sophia de Mello Breyner Andresen

terça-feira, maio 24

O Navio De Espelhos


O navio de espelhos
não navega, cavalga

Seu mar é a floresta
que lhe serve de nível

Ao crepúsculo espelha
sol e lua nos flancos

Por isso o tempo gosta
de deitar-se com ele

Os armadores não amam
a sua rota clara

(Vista do movimento
dir-se-ia que pára)

Quando chega à cidade
nenhum cais o abriga

O seu porão traz nada
nada leva à partida

Vozes e ar pesado
é tudo o que transporta

E no mastro espelhado
uma espécie de porta

Seus dez mil capitães
têm o mesmo rosto

A mesma cinta escura
o mesmo grau e posto

Quando um se revolta
há dez mil insurrectos

(Como os olhos da mosca
reflectem os objectos)

E quando um deles ála
o corpo sobre os mastros
e escruta o mar do fundo

Toda a nave cavalga
(como no espaço os astros)

Do princípio do mundo
até ao fim do mundo



Mário Cesariny

segunda-feira, maio 23

Onde anda você

E por falar em saudade, onde anda você
Onde andam seus olhos que a gente não vê
Onde anda esse corpo que me deixou morto de tanto prazer
E por falar em beleza onde anda a canção
Que se ouvia nas noites dos bares de então
Onde a gente ficava, onde a gente se amava em total solidão
Hoje eu saio na noite vazia, numa boemia sem razão de ser
Na rotina dos bares, que apesar dos pesares me trazem você
E por falar em paixão, em razão de viver
Você bem que podia me aparecer nestes mesmos lugares
Na noite, nos bares, onde anda você


vinicius de moraes

domingo, maio 15

é verdadade, não posso deixar isso morrer... este blog já passou por muito.. é preciso dar-lhe mais uma oportunidade. Ele merece.




Há-de flutuar uma cidade no crepúsculo da vida
pensava eu... como seriam felizes as mulheres
à beira-mar debruçadas para luz caida
remendando o pano das velas espiando o mar
e a longitude do amor embarcado

por vezes
uma gaivota pousava nas águas
outras era o sol que cegava
e um dardo de sangue alastrava pelo linho da noite
os dias lentíssimos... sem ninguém

e nunca me disseram o nome daquele oceano
esperei sentada à porta... dantes escrevia cartas
punha-me a olhar a risca do mar ao fundo da rua
assim envelheci... acreditando que algum homem ao passar
se espantasse com a minha solidão

(anos mais tarde, recordo agora, cresceu-me uma pérola no
coração, mas estou só, muito só, não tenho a quem a deixar.)

um dia houve
que nunca mais avistei cidades crepusculares
e os barcos deixaram de fazer escala à minha porta
inclino-me de novo para o pano deste século
recomeço a bordar ou a dormir
tanto faz
sempre tive dúvidas de que alguma vez me visite a felicidade


Al Berto